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evocações



            FerNANDo criSTo
            19550373


            Tempo de memória                                   a esticar o olho à direita ou à esquerda para manter ali-
                                                               nhada uma frente de três pelotões.
                                                                  Avenida  da  Liberdade…  “força  malta!!...é  jacaré…
                                                               alinha pá… levanta o braço” etc… Restauradores, Rossio,
                 estas memórias que vou alinhando,recordo o tempo   Rua do Ouro, “ai…!!já” não sinto o braço, Rua da Concei-
            Nem que, pela primeira vez, vesti aquela farda azul,   ção…  “força malta está quase…IPE..IPE…” gritam vozes
            cinturão  branco,  dragonas  negras,  barretina  de  penacho   de ex-alunos, que nos acompanham ao longo de todo o
            alvo, como Pilão a minha primeira farda de gala. Para nós   desfile.
            miúdos, foi um dia importante, cerimónia de abertura do                  Com os seus incentivos, levam-
            ano escolar, Outubro de 1955. Tivemos horas de treino,                nos  «ao  colo»  naquela  subida  final
            comportamento militar adequado às formalidades cerimo-                até  à  Sé.  Rua  de  paralelepípedo,
            niais, etc.,outros tempos.                                            calhas  de  eléctricos  em  que  tudo
                                              Pessoas importan-                   parece escorregar.
                                           tes, uns à civil outros                   Após  as  cerimónias  religiosas,
                                           com  fardas  estrela-                  bonitas  de  ver  e  sentir,  um  ligeiro
                                           das  ou  riscas  doura-                convívio com os familiares e amigos
                                           das, homens de batina                  e,  “toca  a  formar  pessoal”.  Agora,
                                           colorida  (não  mui-   descida escorregadia até à rua do Ouro, Terreiro do Paço,
                                           tos)  eclesiásticos  de   Ribeira das Náus.
                                           «topo»,  coisa  que  eu   Antes do transporte para o “Pilão”, lá estavam os fun-
                                           nunca tinha visto de   cionários  a  cargo  do  mestre  «Cuco»,  com  a  sua  grande
            tão perto. As famílias embevecidas assistindo a todos estes   cesta cheia de sandes com marmelada ou queijo tipo bor-
            movimentos e desfiles, cujo centro das suas atenções, são   racha… e para beber…água!
            aqueles seus pequeninos fardados de gala, “uns homens”!  Muitas memórias se podem registar ao longo dos anos
               As pessoas importantes, olhavam aqueles miúdos com   que estive no “Pilão”. Os tempos não foram fáceis, estudo,
            um sorriso de agrado. Por certo, alguns recordavam naque-  disciplina, regras, normas duras, contavam-se com alguma
            le momento os seus tempos de infância.             impaciência, os anos que faltavam para ostentar o laço de
               Presidia à cerimónia o então Presidente da República,   finalista.
            General Francisco Craveiro Lopes.                     Todos os dias foram importantes. Hoje, os dias também
               Para  além  do  dia  a  dia  escolar,  também  importante,   são importantes, só que ao contrário dos anos 1955 e se-
            tenho na memória o meu primeiro desfile militar, come-  guintes, acho que os anos passam muito depressa.
            morativo do aniversário do “Pilão”, ano de 1956.      Assim, rapidamente cheguei a 1961, dia saudosamente
               Treinos e mais treinos, na véspera do dia do desfile uma   importante, o meu último desfile. O mesmo trajecto até
            azáfama  constante  nos  preparativos,  a  farda  impecável,   ao Terreiro  do  Paço.  Os  cestos  de  sempre,  as  sandes  de
            botões de metal amarelo, tala de madeira (feita nas aulas   sempre, uma novidade…além da água havia sumos!!
            de  trabalhos  manuais),  esfregar  com  um  pano  embebido   Importante sim! O “Pilão” comemorava os seus 50 anos
            em solarine, com cuidado para não sujar o dólman, sapatos   de existência e eu conquistava o meu laço de finalista .
            a brilhar, inspecção rigorosa a cargo do aluno graduado, etc.  Enquanto não vem o esquecimento, fica-me na memó-
               Chegou o dia. Preparados com espingarda e baioneta   ria um tempo presente. A tristeza sentida de perder um
            a sério, formados na parada da 1ª Secção, quatro Compa-  companheiro jovem do nosso tempo, malta de 1955/1962/3,
            nhias de alunos vão desfilar desde a praça de Marquês de   o Policarpo, 1955.0214. Reparem na primeira foto, aber-
            Pombal  até  à  Sé  de                             tura do ano lecti-
            Lisboa.  Não  era  «pêra                           vo,  o  terceiro  a
            doce»,  miúdos  com                                contar  da  direita.
            11/12 anos, de«canhota»                            O  «miúdo»  está
            ao ombro, ângulo recto                             lá…  é  a  minha
            no braço, perna estica-                            homenagem,  a
            da, cabeça levantada e                             nossa memória, o
            o alinhamento, sempre                              nosso abraço.



       12  Boletim da associação dos PuPilos do exército
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