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Cultura &            PORquE É quE A LuA NOS MOSTRA
             Actualidade
                                  SEMPRE A MESMA FACE?



                   ualquer  observador  da    ríodo de translação.
                   Lua  repara  rapidamente      Sempre que se observa na Nature-
                   que,  curiosamente,  esta   za uma tamanha coincidência, somos
                   nos mostra sempre a mes-   levados  a  pensar  que  talvez  não  se
         Qma cara. Para os mais dis-          trate de uma verdadeira obra do aca-
         traídos isto até pode parecer natural,   so,  mas  sim  de  algo  natural.  Tanto
         pois afinal de contas a Lua só é Lua   mais que quando observamos a maior
         quando  tem  a  cara  conhecida  e  por   parte dos satélites dos outros plane-
         isso mesmo outra cara seria impensá-  tas  do  nosso  sistema  solar,  verifica-
         vel!  No  entanto,  se  pensarmos  um   mos que esta formidável relação entre
         pouco  mais  na  sua  natureza  física  e   os  períodos  de  rotação  e  translação
                           pusermos de par-   também se verifica. Mas então, a que
                           te  o  nosso  senso   se deverá este curioso fenómeno?
                           comum,    vemos       Mais  uma  vez  a  resposta  está  na
                           que  a  Lua  é  um   força de gravidade. Sim, a mesma for-  O nariz da lua pode ser visto como a deforma-
                           planeta    como    ça  que  mantém  a  Lua  em  órbita  da   ção  permanente  que  faz  com  que  esta  fique
                           qualquer  outro  e,   Terra é responsável pelo sincronismo   sempre virada para a Terra.
                           como  tal,  deve   dos seus dois movimentos de rotação
                           possuir uma rota-  principais! No entanto, não podemos   ma-se,  transformando-se  num  elip-
                           ção  própria.  Na   pensar na Lua como um ponto que or-  soide  com  a  forma  aproximada  de
              Alexandre    realidade  é  exac-  bita  a  Terra,  temos  sim  que  ter  em   uma bola de rugby. Ora, enquanto a
         Morgado Correia   tamente  isso  que   conta a sua forma e estrutura interna:   sincronização  não  é  alcançada,  os
                           acontece,  a  Lua   as  zonas  da  Lua  mais  próximas  da   pontos da Lua vão sofrer constante-
                           roda  tal  como  a   Terra vão sofrer uma atracção maior   mente uma modificação da sua posi-
         Terra em torno de um eixo imaginá-   que  as  zonas  mais  afastadas.  A  esta   ção, oscilando entre a forma esférica e
         rio.  Mas  assim  sendo,  porque  razão   atracção  diferencial  das  diferentes   a elipsoide. Quando chegamos à posi-
         não vemos nós o disco da Lua variar?   partes de um corpo chama-se “efeito   ção de sincronismo, temos permanen-
         A resposta a esta pergunta não é com-  de  maré”.  O  nome  provém  do  facto   temente  a  Lua  com  forma  elipsoide,
         plicada, devendo-se ao facto de o tem-  deste fenómeno ser também o respon-  com as extremidades colocadas na di-
         po que esta demora a completar uma   sável  pela  existência  de  marés  nos   recção que a une à Terra. Nesta situa-
         rotação sobre si própria - período de   oceanos da Terra. Na Lua não existem   ção a Lua fica permanentemente de-
         rotação - coincidir exactamente com o   oceanos mas todo o planeta sofre a ac-  formada, mas nenhum dos seus pon-
         tempo que esta leva a completar uma   ção desta força que o deforma cons-  tos sofre mais modificação de posição.
         volta em torno do nosso planeta - pe-  tantemente.  A  consequente  fricção   Na  realidade  os  astrónomos  conse-
                                              entre as suas camadas interiores re-  guem observar cerca de 60 % da su-
                                              sulta em dissipação de energia inter-  perfície  lunar  a  partir  da  Terra  (em
                                              na que nos casos mais violentos pode   vez  da  metade  prevista  pela  teoria).
                                              originar vulcões (como se observa na   Isto  não  está  de  forma  alguma  em
                                              lua joviana, Io). Aquando da sua for-  contradição  com  o  que  acaba  de  ser
                                              mação a Lua possuía, tal como os ou-  explicado  nos  parágrafos  preceden-
                                              tros astros, um período de rotação in-  tes. O que sucede é que até aqui temos
                                              dependente e com uma duração infe-   considerado a órbita da Lua circular.
                                              rior a alguns dias. Contudo, sob a ac-  Como se sabe isto não é bem verdade:
                                              ção contínua dos efeitos de maré pro-  a órbita lunar, embora bastante pró-
                                              vocados pela presença da Terra, o seu   xima de um círculo perfeito, é afinal
                                              período  de  rotação  foi  aumentando   uma elipse.
                                              constantemente até atingir o patamar   Desta forma, consoante a posição
                                              em que hoje se encontra. A situação   da Lua na sua órbita assim se conse-
                                              actual  é  estável  pois  corresponde  a   gue espreitar um pouco mais além. Só
                                              um mínimo de dissipação de energia.   foi  possível  observar  a  restante  su-
                                              Intuitivamente  pode-se  tentar  com-  perfície lunar com o auxílio de sondas
                                              preender a situação actual através do   espaciais.  Só  em  1993  com  a  sonda
                                              modelo da “bola de rugby”. Imagine-  “Clementine”, se conseguiu cartogra-
                                              se que a Lua é uma esfera perfeita. Na   far  na  totalidade  a  superfície  desco-
                                              presença do efeito de maré ela defor-  nhecida!!!



           44 | Associação dos Pupilos do Exército
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