Page 42 - Boletim APE_226
P. 42

cuLTuRA E cONhEcImENTO






                                  A emergência



                                  do Cristianismo


           JOSÉ PEREIRA
           19510211




                a antiga Grécia havia religiões cívicas e mistéricas em   Jesus  teve  os  seus  primeiros  trinta  anos  obscuros  e
           Nque as primeiras implicavam uma participação obri-  apresenta-se na vida pública quando foi baptizado por João
           gatória, enquanto as segundas suscitavam uma adesão, uma   Baptista.
           crença voluntária.                                    Vejamos os principais traços que O caracterizam:
              Entretanto  o  helenismo  cria  o  conceito  de  ecúmena,   –  É um Homem que aparece a falar; é um pregador que
           isto é, a comunidade dos habitantes da terra. Há grande   fala através de quadros da vida quotidiana (não é um filó-
           expansão  do  comércio  com  novas  vias  de  penetração  e   sofo, não tem linguagem abstracta);
           escoamento.                                           –  Ele ensina. Utiliza um método didáctico, um método
              São os diádocos – sucessores de Alexandre Magno que   inteligente em que há um programa carregado de enigmas
           continuaram a helenização do império, entretanto dividido   e de parábolas, concluído com um apelo ético.
           – são eles que fazem a política de expansão e osmose da   –  Trata-se  de  um  observador  da  natureza  rural  e  da
           cultura persa e grega e restabelecem as rotas dos fenícios.   natureza humana, como o comprovam as suas frequentes
           Fundam  cidades  (cerca  de  70),  que  contribuem  para  a   reflexões e reparos.
           revolução económica que então ocorre.                 –  Fala como quem tem autoridade: Como um rabi ou
              Nesta época, há aspectos políticos que, por influência   um doutor. Cultiva no seu discurso o diálogo: fala e ouve.
           oriental, entram nos usos romanos: A sacralização do poder;   Eivado de um radicalismo ético, aparece sempre empe-
           o  culto  da  pessoa  do  imperador;  o  lealismo  à  pessoa  do   nhado na sua missão no meio de problemas e armadilhas.
           príncipe.                                          Mas o seu radicalismo ético manifesta-se apenas no domí-
              No século II a.C., no Egipto, os diádocos da dinastia dos   nio dos princípios que proclama, pois é tolerante na relação
           Lágidas- sendo pagãos- apoiaram a tradução da Bíblia dos   com os outros. Ele vai a casa do publicano, do centurião
           Judeus para a língua grega. Assim se escreve a Bíblia dos   romano, fala com as pecadoras a quem recomenda o arre-
           Setenta- a Septuaginta – cuja tradução termina no tempo   pendimento e a mudança de vida.
           de Filon de Alexandria. Tal vai permitir a sua divulgação na   Mas há outros aspectos:
           ecúmena na época em que se regista a encarnação de Jesus.  Os factos da sua vida parecem correr para um ponto
              O Cristianismo parte de um acontecimento, com dois   culminante, que é mais evidente no final.
           polos: o nascimento e a morte de Jesus. Tem a natureza de   É liberal na interpretação da lei, que interpreta numa
           religião mistérica e também pessoal, defendendo que todos   forma de espírito e não de letra, no conceito de que a lei
           os  homens  são  igualmente  “filhos  de  Deus”  terminando   é para os homens e não estes para a lei.
           com o etnocentrismo judaico em que os judeus se consi-  Apresenta-se sempre como um centro de calma. Tudo
           deravam “povo eleito”.                             isto irrita os saduceus e os fariseus, que espreitam a ocasião
              As fontes judaicas dão importância aos primeiros tem-  para o acusarem.
           pos  do  Cristianismo,  enquanto  as  fontes  pagãs  dizem   Vão aparecer as ocasiões. Uma surge quando ele der-
           pouco. Há dois autores judaicos contemporâneos de Cris-  ruba as mesas dos vendilhões do Templo.
           to que são Filon de Alexandria e Flávio Josefo.       Outra, quando entra em Jerusalém e é aclamado como
              Os manuscritos do Mar Morto recentemente descober-  Messias,  e  ele  aceita.  Para  os  Judeus  tal  atitude  é  uma
           tos (1960/70) nas grutas de Qumram, revelam-se de inte-  blasfémia. A sua figura e atitudes não se coadunavam com
           resse para confirmar outras fontes. Supõe-se que foram es-  a ideia que os Judeus tinham do Messias, que era a de um
           critos pelos Essénios que eram uma comunidade judaica a   rei potente, invencível, fortíssimo, senhor de exércitos.
           que teria pertencido João Baptista e estava fora do judaísmo
           oficial. Alimentavam uma mística messiânica de que chega-  Bibliografia
           vam tempos novos e era preciso que o povo se preparasse.  Marcel  Simon  e André  Benoit,  Judaismo  e  Cristianismo Antigo,
                                                                 S. Paulo, Editora da Universidade de S.Paulo, 1987.
                            Jesus de Nazaré                   François  Lebrun,  As  grandes  datas  do  Cristianismo,  Lisboa,  Ed.
              O grande inspirador do Cristianismo e sua figura central,   Notícias, 1990.
           nasceu  de  6  a  4  a.  C.  (segundo  o  calendário  actual)  em   Bíblia Sagrada: O Antigo e o Novo Testamento.
                                                              Apontamentos das aulas de História do Cristianismo, lec. pelo Prof.
           Belém da Judeia no tempo do primeiro Imperador romano,   Armando  Martins,  no  Curso  de  História  da  Faculdade  de
           César Augusto, suserano de Herodes o Grande, rei da Judeia.   Letras da U. de Lisboa.



           40  |  Boletim da Associação dos Pupilos do Exército
   37   38   39   40   41   42   43   44   45   46   47