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EVOcAÇÕEs











           Como nasce um paradigma?


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                                                                                                       19720021




              “Não sei, as coisas sempre foram assim por aqui…”  Se fosse possível perguntar a algum deles por que batiam
                                                              em quem tentasse subir a escada, com certeza a resposta seria:
              egundo o Dicionário Universal da Língua Portuguesa,   “Não sei, as coisas sempre foram assim por aqui...”
           Sda  Texto  Editora,  1995,  1ª  Edição,  um  paradigma   Imagino  já  quem  pergunte  qual  a  razão  de  escrever
           significa: um modelo; uma norma; um padrão.        um artigo sobre esta experiência, mas digo que, depois de
              Há algum tempo atrás recebi um e-mail com um tí-  a ter lido (independentemente da mesma ser verdadeira
           tulo  bastante  sugestivo:  “Como  nasce  um  paradigma?”:   ou não), me lembrei do paradigma em que vivi enquanto
           apesar de pensar ser mais um daqueles que recebo e clas-  aluno dos Pupilos, e de ter sobre ele agora questionado
           sifico de “e-mails da treta”, a credibilidade do remetente   alguns modos de actuação, que à época nunca ousei ques-
           e o título, levaram-me, quase de imediato, a abrir e ler o   tionar.
           seu conteúdo.                                         Questiono-me essencialmente sobre as praxes que se
              O texto explicava o nascimento de um paradigma e,   faziam aos alunos mais novos, e se os alunos mais velhos,
           para melhor entendimento do que escreverei mais adian-  que as praticavam, saberiam responder à pergunta deixa-
           te, peço que o leiam. Dizia exactamente assim:     da no final da experiência do e-mail. Estou convencido
              Um  grupo  de  cientistas  colocou  cinco  macacos  numa   que  a  resposta  seria  exactamente  igual  àquela  que  os
           jaula, em cujo centro puseram uma escada e, sobre ela, um   cientistas pensavam receber se os intervenientes da expe-
           cacho de bananas.                                  riência falassem:
              Quando  um  macaco  subia  a  escada                  “Não sei, as coisas sempre foram assim por aqui…”
           para  apanhar  as  bananas,  os  cientistas                     Pensando no paradigma relatado naquela
           lançavam um jacto de água fria nos que                             experiência,  recuei  rapidamente  no
           estavam no chão.                                                      tempo quarenta anos e transportei-
              Depois  de  certo  tempo,  quando  um                              -me  para  o  início  dos  anos  70.
           macaco ia subir a escada, os outros en-                               Revi-me na condição de aluno mais
           chiam-no de pancada.                                                  novo  e,  num  ápice,  disparam  na
              Passado mais algum tempo, ne-                                      minha  mente  e  numa  fracção  de
           nhum macaco subia mais a esca-                                        segundos, milhentas lembranças:
           da, apesar da tentação das bana-                                         – Quem não se lembra de ser
           nas.                                                                  sido mandado por um aluno mais
              Então, os cientistas substituíram um dos cinco                     velho medir a parada com um pau
           macacos.                                           de fósforo e de, depois de ter passado horas a medir, no
              A  primeira  coisa  que  ele  fez  foi  subir  a  escada,  sendo   final, o resultado em número de paus ser sempre consi-
           rapidamente dela retirado pelos outros, que o surraram.  derado errado, sendo obrigado a repetir a medição?
              Depois  de  algumas  surras,  o  novo  integrante  do  grupo   – Quem não se lembra de ter “lerpado”, para os mais
           não subia mais a escada.                           velhos, os “comes” que trazia no final de domingo, depois
              Um segundo macaco foi substituído, e o mesmo ocorreu,   de mais uma saída de fim-de-semana?
           tendo o primeiro substituto participado, com entusiasmo, da   –  Quem  não  se  lembra  de  passar  horas  a  engraxar
           surra ao novato.                                   sapatos, a arear botões e a fazer camas nas camaratas dos
              Um terceiro foi trocado, e repetiu-se o facto.  alunos mais velhos?
              Um quarto e, finalmente, o último dos veteranos foi   – Quem não se lembra do Carnaval, tão temido pelos
           substituído.                                       alunos  mais  novos  que,  só  pelas  histórias  que  ouviam
              Os  cientistas  ficaram,  então,  com  um  grupo  de  cinco   contar, se lhes fosse possível, passariam de bom grado esta
           macacos que, mesmo sem nunca terem tomado um banho de   época fora dos Pupilos?
           água fria, continuavam a bater naquele que tentasse chegar   – Quem não se lembra de, no Carnaval os mais velhos
           às bananas.                                        invadirem as camaratas dos mais novos, e destes para se


                                                                             Boletim da Associação dos Pupilos do Exército  |  15
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