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Crónicas         POBREZA,  PENITÊNCIA  E  SOLIDãO



                    sperava as malas no Ae-     SNI mostrava o mosteiro
                    roporto de Lisboa quan-     de  Alcobaça  como  parte
                    do  um  idiota  afirmou     da  imagem  de  Portugal
                    para o seu colega de via-   para   os   estrangeiros
           E em, “eh pá, afinal a Un-           (para  além  do  galo  de
                    g
           ter  den  Linden  é  igual  à  nossa   Barcelos, os Jerónimos, o
           Avenida  da  Liberdade”.  Ele  refe-  castelo  de  Guimarães,  o
           ria-se a Berlim. Os lugares nunca    traje  minhoto,  a  Batalha
           são iguais, neste caso nem sequer    e a Praia da Rocha). Era o
           semelhantes,  podem  ser  (em  al-   Portugal dos monumen-
           guns casos) parecidos e nessa se-    tos, sol e mar e artesana-
           melhança,  são  muito  diferentes,   to.  Depois  da  Revolução
           pensei.                              de 25 de Abril esta ima-
                               Todos estáva-    gem  caiu  em  desgraça.
                            mos  impacien-      Precisávamos  de  divul-                A esplanada do típico Café Trindade
                            tes  pela  demora   gar um Portugal democrático saí-
                            da  chegada  das    do  tardiamente  da  ditadura.  No     Não conhecia Alcobaça, repito.
                            malas, o meu te-    fim da década de oitenta impunha-    Vivi  mais  de  três  décadas  no  es-
                            lemóvel  tocou.     se promover a imagem do Portu-       trangeiro, conheço melhor a Flóri-
                            Era  o  meu  ami-   gal  moderno,  o  cavaquismo,  as    da do que Beja (onde nunca fui) ou
                            go  Rui  Rasqui-    auto-estradas,  a  Expo…  Este  pro-  Guimarães (de que gosto muito) e
                            lho,  a  convidar-  jecto,  percebemos  hoje,  ficou  a   sinto-me  tão  bem  em  Brasília  ou
           Jacinto Almeida  me  para  visitar   meio caminho; Portugal é moder-      no Rio de Janeiro como em Alca-
                  (19510049  o  Mosteiro  de    no em relação ao que era, mas não    nhões, onde nasci e onde vivo.
                            Alcobaça de que     o é em relação aos países de gran-     Mas vamos a Alcobaça. Conhe-
                            (na  altura)  era   de parte dos estrangeiros que nos    cer  o  Mosteiro  pela  mão  do  Rui
           director. Alcobaça? Desliguei o te-  visitam (em sua maioria oriundos     Rasquilho é uma viagem na Histó-
           lefone e pensei em Chartres, na ca-  de uma Europa mais moderna que       ria, através das suas lendas e mis-
           tedral que visitei há muitos anos,   Portugal). Mas o mosteiro de Al-     térios.  Mergulhei  no  século  XII,
           “vitraux  por  vitraux”  (era  jovem,   cobaça  faz  parte  da  nossa  identi-  Bernardo de Claraval (filho primo-
           hoje não tenho paciência para vi-    dade  no  quadro  da  arquitectura   génito de boa família, iniciado na
           sitas tão minuciosas). Nunca fui a   religiosa  e  a  identidade,  sim,  a   cavalaria, o que ajudou a sua gló-
           Alcobaça…pensei.                     identidade é cada vez mais impor-    ria)  que  segundo  seu  biógrafo
              A caminho do carro o idiota re-   tante  no  mundo  globalizado.  A    Saint-Thierry “não teve outro mes-
           petiu para o amigo: “não achaste a   identidade  antes  de  1974  era  im-  tre  para  além  das  castanheiras  e
           Unter den Linden parecida com a      portante por causa do nacionalis-    das  faias”,  a  Ordem  de  Cister,  as
           Avenida da Liberdade?”. O outro      mo e da ditadura, agora não é me-    construções  cistercientes,  a  im-
           não respondeu, parecia ensonado.     nos importante por causa da glo-     portância da Abadia de Alcobaça
              No  tempo  do  Estado  Novo,  o   balização.                           no contexto da arquitectura cister-
                                                                                     ciense europeia e, estremeci ao ou-
                                                                                     vir,  as  palavras  de  ordem  da  Or-
                                                                                     dem: pobreza, penitência e solidão.
                                                                                     Simplicidade  das  formas,  “Clari-
                                                                                     val  condenava  o  luxo  das  igrejas
                                                                                     beneditinas”,  e  austeridade…a  vi-
                                                                                     sita foi uma boa surpresa. Nunca
                                                                                     ouvira antes a palavra cisterciense
                                                                                     que custei a pronunciar. As ques-
                                                                                     tões  ligadas  à  religião  nunca  me
                                                                                     interessaram.  Segundo  um  cro-
                                                                                     nista  cisterciense,  a  fundação  da
                                                                                     Abadia de Alcobaça, a última cria-
                                                                                     da em vida de São Bernardo, ficou
                                                                                     a dever-se à promessa de D. Afon-
                                                                                     so Henriques de doar a sua herda-
                                                                                     de de Alcobaça a Bernardo de Cla-
                         Monumento Nacional - o belíssimo Mosteiro de Alcobaça       raval se, com a sua protecção, der-


             24 | Associação dos Pupilos do Exército                                                                                                                                                             Associação dos Pupilos do Exército | 25



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