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cuLTuRA E cONhEcImENTO (cont.)
também para cumprimentar Cunhal, não pela sua ideo-
logia que não partilhamos, mas pela sua carreira política
de luta antifascista, e pela coerência e determinação nos
seus ideais.
Falemos agora da ópera; Blimunda foi para mim uma
grande surpresa, pois que achava ser quase impossível
encenar num palco, algo de tão complexo como o “Me-
morial do Convento”, mas, por estranho que pareça, isso
foi completamente conseguido. Não sei se, alguém que
não tivesse lido o livro, conseguiria entrar totalmente no
que o espectáculo nos queria transmitir, mas eu vi ali, toda
a súmula daquele livro extraordinário.
A música é diferente. Quem fosse à espera de uma
ópera tipo clássico, talvez se arrepiasse um pouco com
algumas dissonâncias apresentadas mas, penso que a me-
lodia, muito apoiada em violinos e violoncelos, transmitia
conhecedor da obra de Saramago. Gorghi, por seu lado, muito a sensibilidade da mulher que dá nome à obra;
era já um compositor consagrado. BLIMUNDA.
Tive o privilégio de ver Blimunda no teatro de São A ópera termina como o livro. Baltazar foge na passa-
Carlos em Lisboa, na sua segunda sessão, onde, por acaso, rola de Bartolomeu subindo nos céus e Blimunda procura-
Saramago, acompanhado do seu amigo Álvaro Cunhal, o incessantemente vindo a encontrá-lo na fogueira da
estava presente. Num dos intervalos, entre actos, eu e Inquisição pagando pelo “pecado” de querer assemelhar-se
minha mulher, fomos cumprimentar Saramago a quem a Deus. E então, Blimunda, que ainda não tinha comido,
expressámos a nossa admiração pela sua obra e também olha-o pela primeira vez nas entranhas e tira-lhe as von-
pela ópera, em que colaborou no “Libreto”. Aproveitámos tades, pois que estas, só aos dois pertenciam.
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