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evocações
AmíLcAr AUgUSTo PireS
19560209
encontros “pilónicos” – X
os princípios dos anos noventa uma colega de tra- Alertei-a para saber a opinião do filho e das possíveis
Nbalho, sabendo que eu tinha andado no ”Pilão”, saudades que iria sentir que tantas lágrimas me fizeram
pediu o meu parecer acerca da eventual ida do seu filho verter às escondidas dos meus colegas.
para o nosso Instituto. Ela disse-me que esse era o grande receio pois nem
Os tempos e as condições eram totalmente diferentes por um dia em toda a sua vida se tinha separado dela.
das minhas, mas mesmo assim não deixei de lhe dizer Falava, falava e eu lembrava-me da primeira vez que saí
que era uma boa opção. da minha aldeia. Tinha sete anos.
Ela argumentava que o rapaz era filho único e preci- Fui para a colónia balnear da Guarda Fiscal na Póvoa
sava de conviver mais com outros miúdos, o que não do Varzim.
tinha acontecido comigo. Andei pela primeira vez de comboio. Os bancos eram
Ele vivia em Lisboa e tinha mil alternativas. Eu vivia de ripas de madeira, mais duros que as pedras. Perguntei
numa aldeia do nordeste transmontano e eventualmente ao guarda que nos acompanhava porque não íamos para
teria mais uma. outra carruagem com melhores assentos.
Ele explicou-me que as outras carruagens eram de
primeira ou segunda classe e nós tínhamos bilhetes de
terceira. Então ainda quis saber porque alguns iam na-
quelas e nós em terceira e ele secamente respondeu:
Porque não há quarta!...
A minha colega frisou ainda que o filho gostava mui-
to de fardas e o seu entusiasmo tinha também a ver com
isso.
Claro que o filho nada tinha a perder pois os pais
tinham posses e se não gostasse facilmente poderia vol-
tar para outro colégio.
O mesmo não sucedeu comigo pois era o “Pilão” ou
talvez as oficinas de São José onde estava um padre meu
conterrâneo.
Também nessa altura seria mais fácil entrar nos Pu-
pilos do que em 1956. Concorríamos para as vagas
existentes no nosso grupo, no meu caso o segundo com
oitenta candidatos para apenas ficarem seis.
Os nossos filhos vieram mais tarde a apanhar o
“numerus clausus” na Universidade mas nós já o tivemos
nessa altura no “Pilão”.
Entretanto o nosso futuro puto foi operado a
uma perna e mesmo assim à “Robocop” entrou no Ins-
tituto.
A mãe passados dois dias entrou no meu gabinete a
chorar. Bem, o rapaz levou uns caldos, já passou pela
Madalena, pensei eu.
Continuando a soluçar, contou-me que telefonou
ao filho e ao perguntar-lhe se tinha saudades dela res-
pondeu-lhe: Não só tenho da gata!...
6 Boletim da associação dos PuPilos do exército