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A vivência do amor...
imenso espaço que é a vida. e raramente podemos escolher Tudo o que é demonstrado por
os parceiros de viagem ou mesmo aqueles com quem prova, pressupõem uma pré-existên-
entabulamos conversa num qualquer cais do universo. e cia. Não se pode provar, o que não
se ficamos calados, absortos numa solidão a que queremos existe. Portanto o amor tem necessa-
chamar só nossa, é impossível alhearmo-nos dos sussurros riamente de ser pré existente às
dos outros, mesmo que estes estejam igualmente mudos, provas de amor.
de olhares parados e corpos inertes, porque eles estão lá e mAriANA T. Todavia também é verdade que o
então nós não somos apenas nós. somos nós e os outros. DA moTTA amor enquanto sentimento íntimo e
somos nós e aquilo que vemos nos outros. nós e aquilo individual somente se pode expressar e ganhar "reali-
que pressentimos nos outros e quando um dos outros se dade" através das provas que dele conseguirmos dar.
move, somos nós que nos movemos porque a multidão Assim, o amor é um sentimento silencioso, pessoal
dos outros é a nossa própria e uni-pessoal multidão. e inútil se não for acompanhado, alimentado, revelado
os sonhos, os projectos, os anseios, os sucessos, as con- pelas provas de sua existência.
quistas, os desaires, as tragédias e as tristezas dos outros, Quero dizer, o amor sem provas é um vazio para o
são as nossas próprias, mesmo que as tentemos ignorar. e objecto amado. A prova do amor, ou seja, a manifesta-
todas estas emoções, certezas ou sensações interferem no ção permanente e contínua desse sentimento é além da
desenrolar do nosso próprio sonho. e elas alimentam tam- sua revelação, o seu verdadeiro exercício.
bém o ciclo da nossa vida que é inseparável da vida de Por isso posso concordar que o amor verdadeiro
todos os outros que connosco interagem, mesmo quando demonstra-se, vive-se e prova-se todos os dias em todos
julgamos ser só nós o centro de tudo, somos apenas um os momentos e circunstâncias da vida, especialmente
centro virtual concêntrico e ao mesmo tempo desconexo nas dificuldades.
com o infinito, de centros que constituem tudo o que nos Trata-se, pois, de exercer o amor e este exercício é,
rodeia. muito especialmente os outros, as pessoas. realmente, feito de provas, de revelação, de dádiva e de
entrega.
por isso, quando escrevo, é este universo imenso, indes-
O que é mais extraordinário é que o amor pode
critível e difuso que me assalta e me guia na viagem existir sem provas mas a falta delas faz desse amor um
misteriosa da escrita... sentimento inútil e platónico.
lisboa. 14. fevereiro. 2010
Boletim da associação dos PuPilos do exército 19