Page 8 - Boletim APE - 250
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CróniCaS
 PALAVRAS DESENHADAS rECuPErAr O FuTurO...
 eu sei que pode parecer desajustado, anacrónico até, usar esta expressão que nos remete para uma situação sem sentido, na ordem natural das coisas. como recuperar aquilo que ainda não sucedeu?
vivemos um tempo que, em princípio, em termos gené- ricos e relativos a cada época, não diferirá muito do tempo já passado. quero com isto dizer que, de acordo com as con- dicionantes e parâmetros de cada época, aqueles que po- dem definir os hábitos e práticas da sociedade ao tempo de cada evento e como essas marcas se vão adaptando àquilo que se poderá chamar progresso e evolução, podemos ter a sensação de que o modus-vivendi de cada tempo se conju- ga com esse mesmo tempo e assim daí não virão ameaças significativas para um futuro que ainda é desconhecido!...
acontece que, hoje em dia, o futuro já não será total- mente desconhecido e daí a grande diferença, que nos re- mete, cada vez mais, para uma crescente necessidade de sermos capazes de projectar no vazio desconhecido desse futuro as consequências daquilo que hoje consideramos consentâneo com o tempo que vivemos. aquilo que hoje vivemos e o modo como lidamos com a natureza, interferi- rá amanhã nesse tal futuro, com o factor crescente de inter- ferência progressiva que qualquer processo de degradação vai ganhando na sua relação com o planeta e mesmo com o universo. nada, nesta imensidão da vida e do espaço, per- manece imutável e perene ou está especialmente protegi- do pelas consequências de mutações físicas e químicas ou mesmo apenas pela acção pretensamente instintiva e natu- ral dos seres vivos que nela habitam. tudo o que hoje faze- mos se reflectirá naquilo que amanhã virá a ser esse futuro.
o ritmo actual da nossa vida parece ter sido acelerado de um modo quase incontrolável. tudo acontece depressa de mais, mas isso reflecte-se também nos avanços da ciên- cia e na descoberta de novos caminhos para se chegar a mais elevados patamares de conhecimento. e isso é útil e positivo. acontece, no entanto, que o uso descontrolado dessa sede de imediatismo e avidez no alcance de novas metas, sejam elas científicas ou económicas, pode condu- zir-nos a um descontrolo ameaçador de precaução, relati- vamente à preservação de um equilíbrio ambiental, que terá consequências nefastas e quiçá irreversíveis a montan- te no espaço e no tempo. muitas das intervenções do ho- mem, em nome de um progresso sem limites, estarão na origem das alterações climáticas de que tanto se fala e que indubitavelmente ameaçam o futuro da humanidade e mesmo para além dela própria...
mas não são só estas as ameaças de que estamos rode- ados. também no plano estritamente social e mais ainda no
Ernani Balsa
19600300
político, se colocam preocupações cada vez mais evidentes. a política, por muitos considerada uma ciência, tem como elemento de risco, a imponderabilidade do homem e tam- bém a sua ganância de poder. é muito fácil, em nome da política, descurar-se e até manipular-se as variáveis que in- fluenciam os seus efeitos e caminhar também para um ou- tro tipo de desequilíbrio social e comportamental, quase tão ameaçador como aquele que tem a ver essencialmente com os comportamentos do homem perante a natureza, terrestre ou mesmo cósmica.
a premente actualidade das alterações climáticas con- funde-se perigosamente com outros tipos de alterações nas relações entre os humanos e entre estes e a natureza, vegetal ou animal e mesmo com o âmago mais profundo do planeta terra, os seus recursos minerais e energéticos. esta promiscuidade de más práticas reflecte-se negativa- mente no comportamento político e social da população, desde os mais fracos e impotentes até aos escandalosa- mente ricos e poderosos. as guerras e conflitos latentes que brotam de uma paz podre e enganosa, a insuficiência de meios de subsistência, muitas vezes provocada por um cri- minoso uso de recursos naturais necessários ao crescimen- to desgarrado de indústrias poluentes e insensíveis aos seus estragos e exaustão dos subsolos, fazem crescer os fe- nómenos migratórios a que hoje assistimos, sem que um verdadeiro sentido humanitário consiga ou queira mesmo encontrar soluções, mesmo que transitórias, para este dra- ma dos nossos dias. os estados e países mais ricos e mesmo aqueles que já começam a emergir de situações, também elas, de pobreza ou dificuldades sociais e económicas, não conseguem chegar a um consenso sustentável para acudir a estas situações extremas. a própria união europeia, um projecto algo idílico, mas também frágil na sua consistên- cia, tem-se vindo a afundar no seu próprio ego, desde que cometeu o erro de tentar conciliar humanismo, livre circula- ção e sustentabilidade social, com economia e um sistema financeiro de moeda única. não terá sabido ouvir as vozes de alerta que se pronunciaram contra esta tentativa de con- ciliação entre deus e o diabo!... é mais que sabido que quan- do o universo financeiro invade as áreas sociais e humanas da sociedade, é como uma erva daninha que infecta tudo o que vive à sua volta. a união europeia está praticamente moribunda, sem respostas na esfera humanitária e social, sem defesa e defesas, sem uma política comum de solida- riedade activa e sem capacidade para impor um sistema fi- nanceiro que não seja destrutivo e autofágico!...
é pois neste contexto, que a ideia de “recuperar o futu- ro” passa a fazer sentido e mesmo a tornar-se na palavra
6 | Boletim da Associação dos Pupilos do Exército • Julho-Setembro 2018






















































































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