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Crónicas         SER PORTA -                                      O AmOR CEGA

                            ESTAnDARTE nACIOnAL


                 esde que entrei, nes-   trata de um dos 3 Símbolos Na-                 cada pegada se sucede ou-
                 ta Casa, o meu pri-     cionais (os outros são o nosso                 tra e mais outra. Caminho
                 meiro grande objec-     Presidente  da  República  e  o                num  deserto  despido  de
                 tivo era ter boas no-   Hino Nacional). Aparentemen-                   racionalidade,  onde  o  ób-
       Dtas,  talvez  ganhar             te fácil de ser, já numa formatu- Avio, o real, o objectivo e o
       algumas “chapinhas”, mas no       ra não é assim, pois é o único      concreto são secos pelo calor do amor.
       fundo, era ter a média que me     que não pode cair, e em comba-      Entro  num  estado  de  desidratação
       permitisse continuar a estudar    te, deve ser sempre o primeiro      plena, é notória uma carência vital de
       onde mais quero: nos Estabele-    a entrar e o último a sair.         racionalidade.  Começam  as  alucina-
       cimentos de Ensino Militar.         Após  tomar  conhecimento         ções, a visão desfocada da realidade.
          Ser  Aluno  Graduado  não      do  meu  cargo,  veio-me  à  me-                    Os  oásis  sucedem-se
       foi o meu objectivo primordial,   mória a história de um Portu-                       na  minha  mente,  le-
       porém após receber em casa o      guês  cujo  seu  primeiro  nome                     vando-me  para  um
                       telefonema de     era igual ao meu, e que também                      mundo cada vez mais
                       um Oficial do     fora  “Porta-Estandarte”  de  D.                    distante, cada vez me-
                       Corpo      de     Afonso  Henriques,  Gonçalo                         nos  racional.  Deixo-
                       Alunos,     a     Mendes da Maia.                                     me ir, eu gosto, afinal
                       questionar  o       Mais conhecido por “o (ve-                        estou  no  paraíso  ou
                       meu  Encar-       lho) Lidador”, travou inúmeras       Mariana Terra   algo parecido.
                       regado     de     batalhas com o primeiro Rei de        Motta (15 Anos)  A  fantasia  apode-
                       Educação  se      Portugal, contra os infiéis (Mu-                    ra-se  de  mim,  habito
                       me  deixava       çulmanos).  Reza  a  lenda,  que    um mundo distante, um mundo meu,
      Gonçalo Cruzeiro   ser Graduado,   numa batalha, as forças portu-      um  mundo  nosso.  A  suave  brisa  do
             (20070207)  a  resposta  foi   calenses estavam a perder, com   deserto rouba-me as memórias da re-
                       afirmativa.       a moral em baixo. Nisto, conse-     alidade,  enfraquecidas  pelo  calor  in-
       Porém,  já  ao  longo  do  ano,  o   gue apanhar um “Estandarte”      tenso do amor. Leva-as para longe, fá-
       meu  tio,  por  sinal  ex-aluno  e   e ergue-o, dando sinal de cora-  las desaparecer no tempo.
       conceituado militar (João Luís    gem e esperança para os seus           A temperatura sobe, tudo à nossa
       da Fonseca Nabais, 207/1960),     subordinados.  Nisto,  os  Mou-     volta  derrete.  Os  sobreviventes  afas-
       me incentivara a ser Graduado,    ros cortam-lhe um dos braços,       tam-se, aquele local já não é fonte de
       caso  fosse  convidado,  pois  tal   mas, com o outro braço, reer-    prazer nem de vida, morreu. E nós lá
       como  ele  fora,  Cmdt.  Pelotão   gueu o “Estandarte”. Os Mou-       ficamos, num lugar deserto, despido,
       da extinta 4ª Companhia, tam-     ros deceparam-lhe o seu outro       pobre  e  isolado,  movidos  pela  força
       bém  queria  ver  o  seu  “suces-  braço, e mesmo a esvair-se em      inquebrável do amor.
       sor”  Graduado.  Outra  pessoa    sangue, com as pernas, diz-se          Bebo  sofregamente  um  golo  de
       que me incentivou a sê-lo foi o   que continuou a erguer o “Es-       água, outro e mais outro. O oásis des-
       meu Pai, também militar e en-     tandarte”, até que lhe cortaram     foca-se, a fantasia foge, saí do estado
       carregado de educação, ex-alu-    as pernas. De acordo com os re-     de desidratação em que me encontra-
       no do CM e que lá foi Graduado    latos confusos da altura, Gon-      va. A realidade começa timidamente
       da  2ª  Companhia,  mas  que      çalo tentou ainda erguer o es-      a surgir, o concreto, o óbvio e o racio-
       também andou no IMPE (ago-        tandarte,  com  a  boca,  mas  os   nal fazem de novo sentido.
       ra IPE), no “Ano Zero”, do cur-   Mouros, que estavam agora a            Olho à minha volta. Choro. Era fe-
       so  de  Engenharia  do  Pilão.    perder terreno, decapitaram o       liz e tu vieste completar essa felicida-
       Sendo eles militares, e ex-alu-   “Lidador”.                          de. Porém juntos destruímo- la, afas-
       nos Graduado, saberia que po-       Porém, o heróico esforço de       tando  aqueles  que  gostavam  de  nós,
       deria contar com os seus sábios   Gonçalo  Mendes  da  Maia  foi      isolando-nos.  Deixámo-nos  seduzir
       conselhos,  e  assim  sendo,  fui   recompensado  com  a  vitória     pelo Amor e ele cegou-nos.
       aos poucos aceitando ser, caso    sobre os Mouros, num dia do
       fosse convidado para Gradua-      longínquo ano de 1170.
       do.                                 Esta mítica personagem é a
          Quis o Destino, que o meu      minha  fonte  de  inspiração,
       cargo  fosse  o  de  Porta-Estan-  para cada cerimónia que vou,
       darte Nacional, uma das posi-     pois creio que é um dos muitos
       ções  mais  conceituadas,  quer   exemplos de patriotismo, mas
       no IPE, quer nas Forças Arma-     dos poucos que são conhecidos
       das, principalmente porque se     como “Porta-Estandarte”.


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