Page 46 - Boletim da APE 270
P. 46

OS NOSSOS PROFISSIONAIS
44 BOLETIM APE | JUL/SET 2023
António Santos
19730262
A vida é por um triz!
Ainda há dias estava a brincar no Colégio Familiar
Sagrado Coração de Jesus, pé descalço, à mercê da
matacanha nas terras vermelhas do alto da falésia da
Fortaleza de S. Miguel de Luanda e já hoje conto 61 anos de
vida e 40 anos de profissão.
Saí dos Pupilos formado em Energia de Sistemas de
potência, infelizmente contra a minha vontade, porque só
haviam 4 cursos e desses, este era aquele que me dava pistas
de uma carreira mais ao ar livre.
Queria ser arquitecto ou um profissional ligado às artes,
desde que nelas entrasse a construção, algo que eu pudesse
edificar com as mãos, mas que tivesse a contribuição lúdica
da alma.
A guerra do Ultramar, que deu os dias mais felizes à
minha mãe, deu o inexorável traço à minha vida.
E porque o dinheiro era contado, fiz as provas para entrar
no Pilão em Luanda e vim para uma escola que tinha cavalos,
televisão, farda para marchar, estudos de alto gabarito e um
exército de amigos.
Enquanto Pupilo, consciente dos valores aprendidos no
Escola, sempre aprumado diante do que tinha que cumprir,
assim foi para a vida, enquanto empregado e mais tarde nos
negócios como empresário, em cada mudança até hoje, é
como se fosse a primeira vez que tivesse saído do Pilão.
Ainda não tinha acabado o curso e já tinha marcado
um estágio de meio ano na Merlin Gerin, uma empresa de
disjuntores e seccionadores de corte de energia. Ainda não
tinha acabado este e já tinha agendado várias entrevistas, e
delas, daquelas que me davam a garantia de trabalhar ao ar
livre, portanto, fora dos escritórios, fora do ar condicionado
dos gabinetes e dos computadores que naquela altura eram
parcos, grandes, lentos e complexos, escolhera então a
Construtora do Tâmara no início da construção do IP3 em
Coimbra/Penacova durante 3 anos. Tinha 120 contos de
vencimento, o dobro do que um Alferes naquela altura, tinha
uma Renault 4L, alojamento e meia pensão. Nesta época
ganhava-se dinheiro.
Era o “dono” dos postes de transformação ao longo
do percurso do IP3, tinha a cargo a manutenção de todo
equipamento operacional da obra e tinha que garantir o
funcionamento de uma velha e gigantesca britadeira, com a
responsabilidade de garantir as quantidades de inertes nas
suas diferentes granulometrias, colocados junto às obras de
arte, religiosamente programadas.
Três anos depois novo desafio, um convite do âmbito
familiar para construir a maior oficina de camiões da Europa
e colocá-la em funcionamento produtivo. E assim passaram
os 10 anos seguintes onde aprendi a lidar com os labirintos
da gestão, com os malabarismos comerciais e, o melhor de
tudo, aprendi muito com os meus cerca de 60 colaboradores.
Faltava-me qualquer coisa, talvez o ar livre, talvez o fruto
visível do esforço, o de ver algo construído à minha frente,
e não aquela mesmice da corrente dos assuntos, uns em









































   44   45   46   47   48