Page 40 - Boletim numero 255 da APE
P. 40

 PALAVRAS SOLTAS
das pessoas e
duo acto de pensar
Ernâni Balsa
19600300
             m exercício quase absurdo seria imaginarmos a exis- É por isso urgente agitar este marasmo do pensamento. tência de pessoas sem a capacidade de pensar. Ou Desobstruir as vias da criatividade e do sonho. Subverter a antes ainda, sem a vontade ou a intuição de pensar. apatia da nossa inteligência adormecida. Criar uma central
   O instinto do pensamento será em si uma razão justificativa do factor racional das pessoas!?... Ou será antes uma facul- dade que é mais ou menos induzida por outras instâncias da vontade e da necessidade que certas pessoas desenvolvem, como resposta às suas dúvidas e a uma insustentável aver- são à resignação, como forma de iludirem as suas próprias fraquezas e frustrações!?...
Olhando hoje à nossa volta é, contudo, pacífico podermos dizer o quanto a abstinência do pensamento grassa na nossa sociedade. E é evidente que, não querendo ser fundamenta- lista nesta afirmação, terei de a enquadrar numa certa forma de exercer o pensamento, porque no fundo, duma forma ins- tintiva, puramente animal, aliada à génese do conceito do racional, o ser humano vai ainda pensando, mas trata-se duma forma de pensar básica e intuitiva, como sinal de um certo instinto de sobrevivência. Pensa-se como se respira, como se cumprem as necessidades fisiológicas, como se cumpre o sexo apenas por cumprir, sem uma componente lúdica a transbordar volúpia e erotismo, como nos locomove- mos por imperiosa necessidade de cumprirmos rituais gregá- rios ditados pelo trabalho, pela disciplina rígida da convivên- cia social ou de formas de lazer amorfo, multiplicadas pelos milhões de seres que nos imitamos todos os dias.
Pensar de outra forma, dum modo inteligente e crítico, irrequieto e compulsivo, irreverente, insubmisso e perma- nentemente insatisfeito, é algo que hoje em dia assalta uma fatia muito diminuta da sociedade. As pessoas estão dema- siado ocupadas a esforçarem-se para não pensar, a abstraí- rem-se do que as rodeia para além dum perímetro que come- ça e acaba no seu umbigo, a encaixarem-se nos projectos, que lúgubres centrais do marketing, da publicidade e do en- tretenimento empacotado dos media televisivos e outros, para si fabricam e divulgam das mais variadas formas. Os po- líticos de manga-de-alpaca e colarinho branco ajudam a insti- tucionalizar esta praga. As pessoas verdadeiramente não pensam, apenas recebem a informação, apreciam, relativi- zam e decidem de acordo com o que lhes é apresentado e suportam os encargos de tudo isso como uma obrigação que lhes acalma a alma e o espírito, julgando assim contribuírem para a satisfação das suas necessidades mais prementes. Mas apenas adiam o seu verdadeiro encontro consigo próprias e desperdiçam o potencial de raciocínio e de liberdade de pen- samento, que as deveria diferenciar de qualquer andróide ou ser amorfo e acrítico ainda por inventar.
quem mais foge à liberdade do pensamento é quem mais defende a tirania do consumível e do consumado. Por- quê pensar em excesso, para além do estritamente exigível e necessário, se tudo se consome e tudo já está consumado nos horizontes daquilo que alguns projectam para o nosso presente e o nosso futuro!?...
de sonhos e do pensamento. uma confraria da discussão permanente. Fóruns, conferências, colóquios. Promover uma feira de novas ideias e uma festa global da alegria e da utilidade de pensar. Introduzir no ensino obrigatório uma disciplina do pensamento e da discussão. Apoiar a contesta- ção como forma lúdica e erudita de exercitar o raciocínio. Em última instância, proibir as pessoas de não pensar e logo a seguir libertá-las para que amanhã seja já proibido proibir. Basta pensar na exequibilidade dos sonhos e na força do nosso pensamento. Porque é urgente pensar.
Miguel Laranjeira
19830572
             Não gosto de Poemas...
Não gosto de poemas De muitos, de todos
E mais os seus dilemas Onde eles todos
 38 | Boletim da Associação dos Pupilos do Exército • outubro a dezembro
Os poetas, falsos profetas Debitam amores,
Dores e rumores
Pelo passar das suas canetas Não gosto de poemas
Com os seus humores
Tristes amores
Enormes dissabores.
Ah! Mas como eu
Quero ser diferente
Digo tudo simplesmente
Como se passa, no interior meu Não gostando de poemas
Das suas rimas e métricas Estudos e dissecações patéticas Por isso mesmo sinto-me poeta
E arrisco, e escrevo o meu...
Só porque não gosto de poemas....





































































   38   39   40   41   42