Page 2 - Anexo do Boletim numero 254 da APE
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CRÓNICAS 
   A ordem jurídica e religiosa da colonização: As Sesmarias
------------------------- José Barbosa Pereira 19510211
As sesmarias, adoptadas como medida de colonização interna, para promover o aumento da área agricultada, garantindo a fixação do povoador e o aproveitamento do solo, podiam revestir a forma plena de propriedade alodial, como também de enfiteuse ou aforamento. A obrigação do cultivo era a condição essencial da sesmaria, mas o prazo para o amanho efectivo nem sempre ficava indicado com precisão (1).
Na sequência da crise demográfica do século XIV foi, no reinado de D. Fernando, que se publicou a Lei das Sesmarias promulgada em Santarém a 28 de Maio de 1375 (2).
As sesmarias não tiveram a sua vigência apenas no Portugal continental, pois, tanto nas ilhas do Atlântico como no Brasil, serviram de princípio norteador ao desbravamento do solo.
As doações de terras no Brasil foram iniciadas desde a estada de Martim Afonso de Sousa, em S. Vicente no ano de 1532, e foram previstas nas cartas de doação e forais (3) dos donatários, bem como nos regimentos do governador-geral, provedor-mor e provedores da Fazenda. Impunham a obrigação do aproveitamento da terra e o pagamento do dízimo à Ordem de Cristo (4).
Com o sistema donatarial, D. João III determina aos capitães-donatários que distribuam terras «de sesmaria» e, uma vez passada a carta de data, o colono entra imediatamente na posse e domínio da terra (5).
Quando Tomé de Sousa foi nomeado governador- geral do Brasil, ordena – lhe o soberano, no regimento de 17 de Dezembro de 1548, que edifique «hua fortaleza e povoação grande e forte en hum lugar conveniente», assinalando – lhe, como «termo e limite , seis léguas para cada parte», outorgando – lhe faculdade de distribuir «as terras que esteverem demtro no dito termo», de acordo com o foral e as normas das Ordenações . Quanto às terras situadas além do referido termo, até o rio São Francisco deveria o Governador examinar os pedidos, informar o Monarca e aguardar o despacho régio (6).
Após a nomeação do Governador geral, o donatário da Capitania do Rio de Santa Cruz (Pernambuco), Duarte Coelho, reclamou, junto do Rei, na defesa de seus direitos, e D. João III aceitou as ponderações apresentadas. Tanto que, uma carta do Governador geral confirma-o, esclarecendo não ter ido a Pernambuco por
haver recebido ordens do Soberano para que o não fizesse. Entretanto, em Pernambuco, Duarte Coelho continuava com o serviço que criara para o registo e controle das distribuições, dentro do espírito de ordem e método que o caracterizavam.
Depois de 1549, com o Regimento dos Provedores, devia o morador, para adquirir o domínio, registar a data nos livros da Provedoria e, desta forma, a terra distribuída passava a constituir património do colono (7).
O Regimento dos Provedores também a pontava a sanção e, assim, a provisão de 27 de Outubro de 1571 ordenava a Cristóvão de Barros que «considerasse devolutas e distribuísse as terras que dentro de um ano não fossem aproveitadas» (8).
No entanto, o problema do aproveitamento não foi olhado com tanto rigor nos primeiros tempos, porquanto, então, o sesmerialismo brasileiro tinha como objetivo imediato menos o abastecimento da população do que o povoamento da colónia, que era questão fundamental.
Mas o sesmeiro (9) não ignorava o risco de infringir os termos da data, quando motivos de força maior o impediam de satisfazer as exigências legais e, então, apressava-se em pedir prorrogação do prazo(10).
Os reis continuavam a incentivar as dadas de sesmaria. É muito claro o alvará de 8 de Dezembro de 1590, onde se lê: « pela informação que tenho do grande benefício e muito proveito que se poderá conseguir a meus vassalos de se povoarem as terras do Brasil, e querendo que os frutos e proveitos delas se lhe comuniquem, para que com mais facilidade as queiram povoar e viver nelas, para as lavrar e aproveitar, hei por bem (...) lhes sejam dadas terras de sesmarias, para nelas plantarem seus mantimentos e fazerem roças de canaviais para sua sustentação» (11).
Em fins do século XVII, as datas de sesmaria passaram a carecer de confirmação régia, e, por carta régia de 20 de Janeiro de 1699 dirigida ao provedor da fazenda real de Pernambuco (12), passaram a pagar um foro tendo em conta a sua qualidade e bondade. No entanto, houve reacção dos juristas, na tradição da opulenta escola portuguesa de juristas, que defendiam a gratuidade das datas (13).
Notas:
(1) A. H. de Oliveira Marques,” Sesmarias” in Dicionário de História de Portugal, dir. por Joel Serrão, vol. V, Porto, Liv. Figueirinhas, 1992, p. 543. (2) Idem, Ibidem, vol. V, p. 544.
2 | Anexo Digital ao Boletim da Associação dos Pupilos do Exército • julho a setembro















































































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